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Mostrando postagens de agosto, 2017

Josué ninguém

Abafado pelo barulho estridente dos fogos de artifícios, fora o choro que, pela primeira vez se encontrara com os tóxicos, porém, necessários fragmentos de ar. Fragmentos estes que se adentraram àquele tão novato pulmão do pequenino que, segundos antes, nascera na sala de parto mal iluminada de número quatro. Veio a vida no único dia do ano em que se dá, formosamente, as boas vindas ao primeiro dia de um mês, mas por ter sido fruto de uma relação indesejada, Josué não fora, da mesma forma, cortejado. No pronto socorro de Santa Sofia o pequeno Josué veio a existência e após complicações no parto, fora entregue aos braços de sua mãe já fora do risco eminente que minutos antes corria. Eis a máxima da vez: Salvaram-no da morte, mas não o salvaram da vida. Após o período de dolorosa amamentação, enrolado em um lençol que já mal cheirava, encontrou-se Josué, enjaulado por quatro paredes de papelão e graças a sua mais inata habilidade fora encontrado, aos prantos, por uma senhora que pela

Menina

Menina, cabelos lisos, olhos curiosos, tão negros como a aura das almas ao seu redor. Dormia, tranquilamente, em seu colchão ao lado dos pais. Tinha medo do escuro, dizia: mal sabia que a escuridão que estava por vir.  A porta abriu-se lentamente, ouvia-se passos pelo corredor escuro e uma voz familiar cochichava palavras aflitas. Segundos depois a menina fora brutalmente acordada por um choro atravessado na garganta alheia: "Diga que é mentira, pelo amor de Deus”. Uma senhora de grandes óculos se aproximou: "Mamãe está nervosa, papai vai conversar com ela" disse a vovó em uma explicação sussurrante. A pequenina coçou os olhos sonolentos e abraçada a seu travesseiro, caminhou pelo chão gélido do corredor de sua casa, atravessou o quintal sem entender muito bem porque havia acordado antes mesmo do sol, que quase sempre, acordava antes dela. Era um dia cinzento em um quarto amarelado, Menina assistia desinteressadamente ao pica-pau, o desenho animado. Olhos verdes lac

Lucidez

Entrou Estevão em seu escritório – depois de ter, finalmente, almoçado volumosas quantias – para continuar o trabalho que postergara até então. Sentou-se em sua poltrona e – enquanto desfrouxava a incômoda gravata – começou a assoviar canções daquele tempo em que se encontrava com os colegas no tão movimentado barzinho da esquina. Os dias deste ano que se esticava lhe acometiam tremenda solidão: não havia se quer pisado em sua própria casa a tempo de jantar em companhia da esposa e filhos. Tirou o saque que mantinha em seu armário – especialmente para dias que, como aquele, lhe amargavam a existência – tomou dois goles diretamente do bico e depois de fazer uma cara que combinava com aquele dia, finalmente se sentou em frente a tela do computador. Ao passo do tempo, às 19 horas, esticou-se até ouvir das colunas, estalos em redenção. Levantou-se e se pôs a caminhar pelo silencioso escritório a fim de esvair-se do tédio paralisante que o cérebro lhe acometia após várias e várias ho